Comissão Processante fez a leitura do relatório. Documento foi escrito com base no segundo pedido de impeachment, feito após o chefe do executivo municipal ser alvo da 2ª fase da Operação Nácar, que é conduzida pela Polícia Federal.
Por g1 Santos
Julgamento do pedido de impeachment contra prefeito do Guarujá, Válter Suman — Foto: Alexsander Ferraz/ A Tribuna Jornal
Por 11 votos a 5, a Câmara Municipal de Guarujá, no litoral de São Paulo, decidiu pelo arquivamento do processo de impeachment contra o prefeito Válter Suman (PSDB), que foi absolvido durante a sessão de julgamento realizada nesta quinta-feira (7).
A sessão estava prevista para iniciar às 10h na Câmara Municipal da cidade, mas por conta da ausência de alguns vereadores só começou por volta das 11h30. Todos os vereadores e o prefeito foram convocados. Suman não compareceu.
Na sessão, o relatório com o parecer escrito pelos membros da Comissão Processante, Santiago dos Santos Angelo (PP), Carlos Vargas (PTB) e Fernando Martins Peitola (MDB) foi lido. Eles tiveram o prazo de 91 dias para elaborar o documento, que foi escrito com base no segundo pedido de impeachment, feito após Suman ser alvo da 2ª fase da Operação Nácar, que é conduzida pela Polícia Federal. Na sequência, seis vereadores se pronunciaram.
Investigado pela 2ª fase da Operação Nácar da Polícia Federal, Válter Suman não comparece, mas envia defesa por descrito à Câmara de Guarujá, SP — Foto: Nina Barbosa e Leandro Guedes/g1
Após a leitura, os parlamentares votaram a favor ou contra o impeachment do prefeito. Caso o parecer fosse favorável ao pedido de impeachment, o prefeito só seria afastado definitivamente se dois terços dos vereadores eleitos votassem a favor, ou seja, todos os 17 parlamentares precisariam estar presentes no julgamento, e 12 deles votarem a favor do afastamento.
Votaram a favor do impeachment, os vereadores: Professor Anderson (Podemos); Toninho Salgado (PSD); Raphael Vitiello (PSD); Wagner dos Santos Venuto (União Brasil) e Nego Walter (União Brasil).
Já os vereadores que negaram o pedido: Aparecido Davi (Republicanos); Carlos Eduardo Vargas (PTB); Fernando Peitola (MDB); Jailton Reis "Sorriso" (PRTB); Ariani Paz (PT); Márcio do Pet Shop (PTB); Mário Lúcio (PSB); Santiago Ângelo (Progressistas); Sérgio Santa Cruz (PSB); Sirana Bonsokian (PTB) e Naldo Perequê (PSB).
O placar da votação foi o mesmo do primeiro processo de impeachment contra o prefeito, realizado em dezembro de 2021. No julgamento, dois vereadores mudaram de voto. Carlos Eduardo Vargas (PTB), que antes foi favorável pela cassação, votou contra. Já o vice-presidente da Câmara, Nego Walter (PSB), foi contrário a cassação, e anteriormente foi a favor.
PF indicia Válter Suman
A Polícia Federal (PF) indiciou o prefeito de Guarujá e mais oito servidores por associação criminosa e corrupção passiva. A decisão foi tomada após desdobramentos das investigações sobre um contrato emergencial firmado pela prefeitura com a empresa AM Silva Serviços Ltda. para a higienização de unidades de saúde. De acordo com relatório da PF, o acordo sob contrato n° 140/2020 foi fraudado.
Válter Suman no retorno ao cargo na Prefeitura de Guarujá, na manhã do último dia 20 de junho — Foto: Alexsander Ferraz/A Tribuna Jornal
Pedido de impeachment
Uma nova Comissão Processante foi formada na 9ª Sessão Ordinária da Câmara Municipal para analisar um novo pedido de impeachment contra o prefeito. A decisão ocorreu após o engenheiro José Manoel Ferreira Gonçalves protocolar um segundo pedido de impeachment de Suman.
No pedido, Gonçalves destaca que alguns vereadores da Casa também são citados no inquérito da PF, por terem sido beneficiados para favorecer o prefeito, e que deveriam ser impedidos de participar da Comissão. Este pedido com relação ao Legislativo, no entanto, foi negado pela Câmara.
Prefeito afastado de Guarujá e primeira dama comparecem no início de maio ao Fórum Federal para colocar tornozeleira eletrônica — Foto: Luciana Moledas/g1 Santos
Na mesma sessão, também foi confirmado que serão integrantes da Comissão Processante os vereadores Santiago dos Santos Angelo (PP) - como membro da comissão -, Carlos Vargas (PTB) - como relator -, e Fernando Martins Peitola (MDB) - como presidente.
O vereador Santiago é citado no mesmo inquérito da Polícia Federal em que o prefeito é investigado, e, após ser sorteado, tentou declinar da participação, mas foi impedido pela Câmara.
No dia 13 de junho, Suman era aguardado para depor na Câmara Municipal de Guarujá. No entanto, ele não compareceu presencialmente para a oitiva, mas protocolou sua defesa por meio de um advogado.
Oitiva do prefeito afastado Válter Suman seria realizada na última segunda-feira (13), na Câmara Municipal de Guarujá — Foto: g1 Santos
Em 6 de junho, outros dois investigados pela mesma operação seriam ouvidos na Câmara Municipal de Guarujá, porém, Celso Roberto Bertoli Junior e Hugo Passos não compareceram à oitiva. A justificativa para o não comparecimento foi a mesma: o juiz teria determinado que os suspeitos não entrassem em repartições públicas.
Celso Roberto Bertoli Junior é ex-diretor de Compras, Licitações e Acompanhamento de Contratos, que, de acordo com a Polícia Federal, era a pessoa que operacionalizava a parte técnica das contratações fraudulentas. Os agentes políticos negociam os contratos e ele operacionalizava para que a contratação fosse direcionada para as empresas corruptoras.
Já Hugo Passos é ex-secretário de Cultura. Segundo a PF, ele era responsável por armazenar parte do dinheiro ilícito arrecadado e realizar pagamentos a mando do prefeito afastado Válter Suman. Ele também seria o responsável pela empresa em que estão registrados dois carros de luxo de Suman.
Válter Suman (PSDB) seria ouvido durante Comissão Processante, nesta segunda-feira (13), na Câmara Municipal de Guarujá, SP — Foto: Leandro Guedes/g1
2ª fase da Operação Nácar
A Comissão foi criada após o chefe do Executivo municipal ser alvo da 2ª fase da Operação Nácar, que é conduzida pela Polícia Federal. A investigação tem como objetivo o combate a possíveis crimes de corrupção, desvios de recursos públicos e outros crimes correlatos envolvendo verbas federais.
Foram cumpridos 55 mandados de busca e apreensão em Guarujá, Santos, São Vicente, São Bernardo do Campo (SP), Carapicuíba (SP), São Paulo (SP), Campos do Jordão (SP) e Brazópolis (MG). Dentre as medidas determinadas pela Justiça Federal, estão o bloqueio de mais de R$ 110 milhões de bens e valores de envolvidos, além do afastamento de ocupantes de cargos comissionados e eletivos de suas funções.
Os suspeitos podem responder pelos crimes de peculato, corrupção ativa e passiva, fraude em licitação, organização criminosa e lavagem de dinheiro. As penas, se somadas, podem variar de 12 a 46 anos de prisão.
A Prefeitura de Guarujá informou que, ante o afastamento liminar de Suman, a vice-prefeita, Adriana Machado, assumiu provisoriamente a função de prefeita em exercício.
A Justiça Federal já determinou que Suman deve usar monitoração eletrônica, assim como alguns dos outros investigados da 2ª fase da operação. Além disso, ele já foi afastado do cargo.
Câmara aprovou abertura de nova Comissão Processante para análise de pedido de impeachment do prefeito de Guarujá, SP — Foto: Luciana Moledas/g1
1ª Comissão Processante e prisão
O prefeito e o ex-secretário de Educação, Marcelo Nicolau, chegaram a ser presos na primeira fase da operação, em setembro de 2021, mas ambos tiveram a liberdade provisória concedidas pela Justiça.
Uma primeira Comissão Processante foi criada em 2021 para analisar o processo de impeachment de Suman. Em 3 de dezembro, Suman protocolou sua defesa na Câmara Municipal.
A Comissão havia sido instaurada após uma denúncia formulada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), também por intermédio de José Manoel Ferreira Gonçalves - que era presidente à época do partido -, a qual pedia pela apuração de eventuais irregularidades relacionadas a contratos firmados entre empresas privadas e a prefeitura na área da Saúde.
Esta primeira Comissão foi formada pelos vereadores Fernando Martins dos Santos (MDB), Juninho Eroso (PP) e Sirana Bosonkian (PTB). Porém, em 16 de dezembro, Suman foi absolvido no processo de impeachment que enfrentava. A sessão de julgamento durou cerca de 20 horas no Plenário da Câmara Municipal. Ao todo, 11 vereadores votaram contra, e cinco a favor do afastamento.
Gastos altos
Imagens obtidas pelo g1 mostram conversas trocadas em um aplicativo de mensagens entre Válter Suman, sua esposa, Edna Suman, e supostos beneficiários de um possível esquema de desvio de dinheiro público apurado pela Polícia Federal.
Os prints das conversas constam no inquérito da Polícia Federal, que foi obtido pela TV Tribuna, afiliada da Rede Globo, e mostram o chefe do Executivo municipal falando da movimentação de alta quantia em dinheiro com outros políticos, familiares e conhecidos, todos investigados durante a operação.
A investigação também apurou os gastos do prefeito e da esposa nos últimos dois anos. De acordo com planilha e extratos de declarações que acompanham o processo, o casal gastou mais de R$ 1,5 milhão apenas em uma loja de roupas. E em duas lojas de joias, teriam gasto mais de R$ 1 milhão.
Além disso, segundo a PF, recentemente o casal comprou dois apartamentos em Campos do Jordão (SP), com custo aproximado de R$ 700 mil. Os imóveis estão registrados em nome dos filhos, e em um deles, foram gastos R$ 300 mil em reformas.
Investigações
A investigação da PF aponta a existência de, pelo menos, duas organizações criminosas, que atuavam e ainda atuam na prefeitura, desviando recursos públicos mediante fraude em contratações públicas e lavagem de dinheiro.
Segundo a PF, a primeira organização criminosa seria chefiada por Suman e pela esposa dele, e era operacionalizada pelo então secretário de Educação, Marcelo Nicolau. A investigação aponta que eles, junto com outros envolvidos, fraudavam contratações públicas, negociando vantagens indevidas com empresários.
A Polícia Federal detectou, também, que os processos de licitação eram fraudados por meio de direcionamento, dispensa e até contratação emergencial, fora do previsto na lei. Segundo a PF, outras pessoas eram usadas para ocultar os valores recebidos, e até pessoas contratadas pela prefeitura eram laranjas.
Além disso, as investigações apontam que a prefeitura tinha o apoio do Legislativo. Os acordos seriam realizados mediante pagamento de vantagens indevidas, em espécie, ou com o loteamento de cargos em empresas que prestam serviço à prefeitura.
A segunda organização criminosa seria chefiada por Almir Matias. A investigação aponta que as contratações firmadas entre o empresário e a prefeitura eram superfaturadas, e a organização repassava recursos por serviços não prestados para empresas fantasma, algumas até controladas por Matias.
Marcelo Nicolau seria, então, o homem que cuidava do recebimento e repassava os recursos para o prefeito e a primeira-dama. Com ele, a PF encontrou contratos já com o valor da propina inicial de negociação e o quantitativo em percentagem referente às vantagens indevidas a serem pagas mensalmente pelas empresas.
Para chegar aos suspeitos, a Polícia Federal analisou documentos, computadores e celulares de todos os envolvidos, após a primeira fase da operação, em setembro de 2021.
Em nota, o advogado José Eduardo dos Santos, que representa Almir Matias e a esposa dele - também investigada -, afirmou que acompanha as investigações. O g1 tentou localizar os advogados dos outros investigados, mas não teve retorno.
Prefeito do Guarujá e primeira dama comparecem ao Fórum Federal para colocar tornozeleira eletrônica — Foto: Luciana Moledas/g1 Santos
Retorno à prefeitura
O prefeito Válter Suman (PSDB) retornou ao cargo em 20 de junho. Ele estava afastado do cargo desde 29 de março, por ser investigado na 2ª fase da Operação Nácar da Polícia Federal, que apura possíveis fraudes em contratações nas áreas da Saúde e da Educação, realizadas pelo município no litoral de São Paulo.
A volta de Suman, confirmada pelo advogado de defesa Edson Asarias, acontece após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ter decidido, em 15 de junho, pelo afastamento das medidas cautelares impostas ao político.
Em 17 de junho, Suman foi até a sede da Polícia Federal, em Santos, e retirou a tornozeleira eletrônica. Com a decisão do STJ, além de retirar o dispositivo do tornozelo e voltar ao cargo e terá livre acesso a prédios da Prefeitura de Guarujá. Vale lembrar que o chefe do Executivo e esposa Edna Suman eram monitorados desde o começo de maio.
Outras medidas, no entanto, foram mantidas pela 5ª Turma do STJ, como a proibição de contatos entre os investigados; comparecimento bimestral em juízo; prestação de esclarecimentos quando solicitados durante o curso das investigações; proibição de ausentar-se do Estado de São Paulo por mais de cinco dias sem autorização, proibição de ausentar-se do país e entrega do passaporte.
Adriana Machado, que assumiu a prefeitura desde o afastamento de Suman, voltou ao cargo de vice-prefeita e às atividades como médica e servidora pública municipal.
Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão na casa do prefeito de Guarujá, Válter Suman — Foto: Nina Barbosa