Data é comemorada neste sábado (19); conheça histórias de vida de pessoas que ajudaram a construir a CellulaMater da Nação
Chico Buarque compôs que o pai era paulista, o avô pernambucano, o bisavô mineiro e o tataravô baiano. Toda essa mistura, descrita na música, é o que nos une como nação, sem fronteiras e com a liberdade de escolher o destino a ser seguido – seja de ônibus, de trem, de pau-de-arara...
As idas e vindas dos brasileiros pelos mais de 8,5 milhões dequilômetros quadradospercorrem estradas, correm o tempo e têm até uma data própria. Neste sábado, 19 de junho,comemora-se o Dia Nacional do Migrante.
Entre os calungas, é visível a presença de representantes de cada cantinho do País.Os nordestinos – é verdade – são maioria.Nas próximas linhas, vamos conhecer as histórias de algumas pessoas que adotaram o chão vicentino como oseu lar.
ELIEL - Entre a imensidão de representantes, Eliel dos Santos, de 46 anos, estádesde 2004 na Primeira Vila do Brasil. Nascido e criado em Estância, no estado de Sergipe, Eliel hoje é comerciante, dono de uma lanchonete no Centro e de um restaurante no bairro Boa Vista. Mas a caminhada para as conquistas foi árdua. Ele chegou à Baixada Santista em 1995, com 19 anos. Morou em Guarujá, em Santos e depois se mudou para o Gonzaguinha. “Em Estância eu tinha uma barraca de verduras na feira. Vim para cá atrás de trabalho. Meu irmão Edilson, já falecido, chegou um ano antes e segui o mesmo caminho”, recorda.
O sonho de vencer na vida esbarrou logo com a realidade dura. “Meu primeiro emprego foi na construção civil,mastambém olhava os carros dos ‘bacanas’ na Praia da Enseada, em troca de gorjetas”, lembra. Depois, fez um pouco de tudo: atuou como balconista em uma padaria, foi atendente em um barzinho de Santos, gerente em uma casa de café no Centro de São Paulo, até que montou o seu próprio restaurante, no Parque São Vicente, em 24 de abril de 2004. As raízes nordestinas eram presentes no cardápio, oferecendo carne seca, sarapatel, mocotó, galo ensopado, escondidinho, entre outros pratos típicos.
Há 17 anos na Cidade e casado com uma piauiense, Eliel se vê como filho da terra. “Moro aqui, meus filhos são nascidos no Hospital São José e me considero vicentino.Foi onde conquistei o pouco que tenho. É uma cidade maravilhosa”, afirma, concluindo que “temos que abraçar quem nos abraça, e São Vicente me abraçou”.
GISELE – Professora concursada desde 2013, a paranaense Gisele Meyer, 39 anos, usa sua experiência de vida no ambiente escolar. “Eu me formei pela Universidade Estadual de Londrina, cidade onde nasci e vivi. Sou uma migrante, e cito isso nas minhas aulas de geografia”, conta a educadora, que antes de ingressar na rede municipal,trabalhou em uma escola estadual (no Parque São Vicente) e em um colégio particular em Praia Grande. “Vim fazer uma experiência, ver se gostava da região, e estou aqui até hoje”.
Conhecer lugares diferentes da terra natal não é novidade para a docente. “Antes de ser professora, fui comissária de voo por dois anos. Conheci todo o Brasil e América do Sul, com exceção do Equador e Venezuela”. Depois, passou quatro meses nos Estados Unidos, para aperfeiçoar o inglês.
Sobre suas origens, ela externa o sentimento. “Meu coração está lá no Paraná, mas já tem um pedaço caiçara dentro dele”, brinca.
PENHA – Décima filha de um total de 13, a educadora e terapeuta capilar Maria da Penha Nascimento Veiga, 52 anos, viajou 2,5 mil quilômetros com os pais e os irmãos de Missão Velha, no Ceará, atéa Baixada Santista. O objetivo não era a busca por um emprego, mas o tratamento do pai, que estava com problemas de saúde. “Eu tinha mais ou menos nove anos quando minha família vendeu tudo o que tinha para seguir para o litoral de São Paulo. Viemos sem perspectiva etodos precisamos trabalhar desde cedo”. Assim, com 13 anos, teve o seu primeiro emprego como caixa de supermercado.
Aos 16, decidiu estudar para ser cabeleireira. Quando casou, em 1994, montou o salão onde está até hoje, na Náutica III. Sempre na busca da evolução profissional, Penha conta que não para de estudar: ela se aperfeiçoou no tratamento de calvície e formou-se em terapia capilar.
Suas recordações do lugar onde nasceu são vagas: lembra-se das igrejas de Missão Velha e quer voltar um dia, a passeio, como marido Marcos e os filhos Lucas (20 anos) e Ana Clara (15). “Escolhi São Vicente para morar e gosto de trabalhar aqui na cidade. Meu salão cresceu, empreguei muita gente e formei muitos profissionais. Tenho clientes do interior de São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba... Sou muita grata por tudo”.
Sobre o pai, os problemas de saúde foram superados e hoje ele está bem, com 88 anos. “Somos uma família de pessoas honestas, vencedoras e continuamos unidos”, completa.
MIRALDA – Natural da Região Nordeste, a alagoana MiraldaNita de Jesus, 53 anos, chegou a São Vicente no início dos anos 1980. Nascida em Alagoas, ela conta que veio com os tios, inicialmente a passeio, mas acabou ficando. “Meu primeiro emprego foi com 14 anos, como empregada doméstica em casa de família”, lembra-se, grata ao casal para o qual trabalhou por seis anos. Depois, foi balconista em uma padaria e partiu para a profissão que atua até hoje: vendedora em loja de móveis.
Perto de completar quatro décadas vivendo nos domínios de Martim Afonso de Sousa, Miralda sacramenta: “Amo São Vicente. Aqui eu construí a minha vida. Trabalhei, casei, tive minhas duas filhas...”. Quanto à região onde viveu até a adolescência, não nega jamais. “Tenho orgulho de minhas origens. O nordestino é um povo de braço forte, guerreiro, trabalhador. Sou das cabeceiras, sim! Nasci em São José da Tapera. Alagoana. Porreta”.
ANTÔNIO – Em 1977, o pernambucano Antônio Firmo Vieira tinha 16 anos e decidiu dar uma guinada na sua vida: deixou a família na cidadeBom Jardim, no agreste, e seguiu, sozinho, para São Vicente. Desde então, mora na Área Continental.
Ele lembra que foi um dos primeiros moradores do Parque das Bandeiras. “Quase não tinha casa nenhuma. A água era tirada do poço e, sem esgoto, tínhamos fossas no quintal. As ruas eram de areia”, recorda.
Sobre as suas conquistas, ele afirma que a batalha foi grande. “Sofri muito nessa vida,porque não é fácil começar. Iniciei como ajudante de pedreiro, trabalhei em algumas firmas, até que passei para o ramo de açougue, sempre como empregado”. Em 1998, já morando no Parque Continental, abriu seu primeiro estabelecimento: uma casa de carnes. “Dividi a casa, que eu mesmo construí, para montar o comércio”. No início era ele e a esposa. Depois contratou um ajudante. “Fui colocando um, mais um, mais um... e hoje tenho um mercado, com uma equipe de 15 funcionários. Isso que importa: dar emprego para ajudar quem está começando”. Com dois filhos criados, ele está com 61 anos e é o exemplo de garra que o migrante carrega nas veias, com determinação e simplicidade, sem nunca esquecer de suas origens.