Um médico recebeu voz de prisão por desacato a autoridade após se recusar a informar o quadro clínico de pacientes na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Rodoviária, em Guarujá, no litoral paulista, na noite da última terça-feira (16). Conforme relatado pela Polícia Militar, o profissional proferiu vários xingamentos contra a equipe e, de acordo com um familiar que estava no local, tentou agredir um homem.
Segundo a dona de casa Carina da Silva Santos Monteiro, de 34 anos, filha de uma paciente de 57 que está internada desde sábado (13) no local, os profissionais da unidade estão há quatro dias sem atualizar o quadro clínico da paciente, que foi diagnosticada com Covid-19 há aproximadamente duas semanas, sendo internada por não conseguir mais respirar sem a ajuda de aparelhos.
Segundo o relato, na noite de sábado, a mulher foi atendida, e a equipe da UPA esclareceu que os parentes não podiam permanecer no local, para evitar o risco de contágio pelo vírus, mas que um médico entraria em contato com os familiares entre 16h e 19h para atualizar sobre a situação da paciente.
No entanto, desde então, a família não recebeu mais informações. Carina conta que a mãe está com o celular e tenta atualizar seu quadro diariamente aos filhos, mas que, em diversas idas ao hospital, o médico não quis atendê-los.
“Eu comecei a chorar, pedir a proteção de Deus, pois estávamos entregando nossa mãe para pessoas que não sabíamos se iriam cuidar bem dela. Não temos informações, tratam as pessoas como cachorros. Está sendo traumatizante”, desabafa.
Indignado com a situação, na noite de terça-feira, Cristiano José de Lima, que também aguardava informações sobre sua tia, entubada com Covid-19 na unidade, acionou a Polícia Militar e denunciou a falta de retorno da equipe médica.
Os policiais se dirigiram à unidade de saúde por volta das 21h30 e ouviram o relato dos presentes. Conforme explicado pela PM, a equipe foi até o médico de plantão para questionar a falta de atualização do quadro dos pacientes.
Entretanto, ainda de acordo com a PM, o profissional, que estava em seu intervalo, se exaltou e proferiu diversos xingamentos contra os policiais e, em seguida, pediu para que saíssem do consultório, mas os agentes permaneceram tentando obter respostas. Segundo Carina, ele ainda tentou agredir o irmão dela, e foi impedido por um dos policiais.
Por conta da conduta do médico, a equipe deu voz de prisão a ele por desacato a autoridade. Contudo, por estar de plantão e atuando na linha de frente do combate à Covid-19, ele não foi levado à delegacia. Um policial permaneceu no local, enquanto os outros acompanharam os familiares dos pacientes à Delegacia Sede do município, onde foram registrados boletins de ocorrência sobre o caso.
A Polícia Militar informou que um inquérito foi aberto para apurar a situação, e que o médico deverá prestar esclarecimentos quando solicitado pela autoridade policial.
Conforme apurado pelo G1, Cristiano conseguiu receber notícias da tia na madrugada desta quarta-feira (17), por meio do secretário de Saúde da cidade, que se dirigiu ao local. Já a família de Carina segue sem qualquer atualização sobre a mãe, e ainda aguarda a resolução do caso.
O G1 procurou a administração da unidade de saúde, que confirmou que a Polícia Militar esteve no local, e que o acompanhante foi esclarecido sobre o estado de saúde de sua familiar. Confira a nota na íntegra:
"A administração da UPA Dr. Matheus Santamaria esclarece que ontem [16/03] compareceu à unidade o familiar de um dos pacientes internados por Covid para solicitar informações de seu estado clínico. Sensibilizado com a situação, um dos médicos plantonistas, que se encontrava atuando diretamente no atendimento da ala de Covid19, tomou ciência do pedido e decidiu ligar para o interessado para prestar as informações desejadas, buscando acalmá-lo.
O acompanhante não se conformou com a tentativa do médico e decidiu solicitar a presença da Polícia Militar, que compareceu em seguida. Acompanhado dos policiais militares, houve nova solicitação da presença pessoal do médico, o que não foi possível por se tratar de profissional dedicado exclusivamente ao atendimento de Covid.
Nesse instante, um dos policiais presentes se dirigiu ao interior da unidade, na tentativa de forçar o contato com o médico, e a partir daí houve desentendimento entre os envolvidos, com expressões verbais em tom ofensivo. A ocorrência foi apresentada na delegacia de polícia.
Reforçamos que as equipes da unidade têm compromisso com a saúde e segurança de pacientes e acompanhantes, e existe um protocolo para preservar a segurança de todos. Entendemos que o momento é sensível, e é preciso confiar no trabalho dos médicos e profissionais qualificados que atuam na linha de frente do combate à doença. O episódio não prejudicou o serviço médico, não atrapalhou a assistência aos pacientes e o acompanhante foi esclarecido sobre o estado de saúde de seu familiar. As equipes da unidade de saúde permanecem à disposição da população para socorrer no que for preciso, sobretudo quanto aos agravos decorrentes da pandemia".
Procurada pelo G1, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) confirmou que um médico de 37 anos foi autuado por desacato, por volta das 21h de terça-feira, na Avenida Santos Dumont, no bairro Vila Santo Antônio, em Guarujá. Policiais militares foram acionados para atender a uma ocorrência de desentendimento em um centro médico. Os familiares de uma paciente internada chamaram a PM porque estavam desde 15h pedindo informações sobre o estado de saúde dela e não recebiam respostas por parte da equipe médica.
Ainda conforme a SSP, os PMs conseguiram conversar com um médico plantonista, que se negou a fornecer qualquer informação e começou a proferir palavras de baixo calão contra os militares. Foi dada voz de prisão ao profissional, que se recusou a ir para a delegacia. O caso foi registrado como desacato na Delegacia Sede de Guarujá.
O G1 tentou contato com o médico envolvido no caso, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.