A infância e adolescência é período ideal para despertar o gosto pelos livros em futuros adultos leitores
São Paulo, 30 de outubro de 2024 - Do antigo papiro, passando pela prensa de Gutemberg, até os atuais aparelhos e-readers, a história dos livros é recheada de clássicos, grandes autores e de muita transmissão de conhecimento. Mas apesar de a leitura ser cada vez mais acessível, poucos brasileiros leem.
A pesquisa “Panorama do Consumo de Livros”, realizada pela Nielsen BookData sob encomenda da Câmara Brasileira do Livro (CBL), revelou que 84% da população adulta brasileira não comprou nenhum livro em 2022. Outro dado alarmante: pesquisa divulgada pelo Centro de Pesquisas em Educação, Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede), em parceria com a plataforma de leitura Árvore, mostrou que entre 66,3% dos alunos brasileiros de 15 e 16 anos, o livro mais extenso já lido não passou de 10 páginas. Nesse cenário, o Brasil ficou em 52º lugar no ranking que avaliou competências de leitura de alunos do 4º ano de 57 países da Associação Internacional para a Avaliação de Conquistas Educacionais.
A leitura contribui para o desenvolvimento do pensamento crítico, ajudando os jovens a refletirem e questionarem as informações que consomem, um aspecto vital em uma sociedade cada vez mais marcada pela dispersão provocada pelas redes sociais e o uso excessivo de telas. Incentivar a leitura desde a infância e a adolescência é essencial para a formação de cidadãos críticos e engajados. Três escolas da grande São Paulo fazem uso de projetos e estratégias para despertar o gosto pela leitura em seus alunos.
Leitura em diversas formas e formatos
No Brazilian International School, na capital paulista, o incentivo à leitura acontece desde a educação infantil, com uma série de projetos que acompanham o desenvolvimento dos alunos ao longo dos anos. Entre as ações promovidas estão atividades como a “caixa de leitura”, onde os pais leem com as crianças em casa e os alunos compartilham suas impressões na escola; o projeto Bookflix, que destaca livros com adaptações em filmes e séries para aproximar os jovens leitores da literatura; a produção de podcasts e dramatizações, em que os estudantes discutem e encenam obras lidas; e a criação de livros autorais pelos alunos mais novos, que exploram temas como sustentabilidade e direitos da criança.
Para Carolina Haddad, aluna do 6º ano, a lembrança do contato inicial com os livros na escola é marcante. Ela conta que, aos três anos, os pais pegavam um livro da caixa de leitura e liam para ela durante a semana, ajudando-a a construir desde cedo uma relação com a literatura. Hoje, aos 12 anos, a jovem frequenta assiduamente a biblioteca, onde continua a cultivar o hábito de leitura.
Na escolha dos títulos, a bibliotecária Aline Souza Silva Santos considera o feedback dos próprios alunos. Ela destaca a aceitação de obras como O Diário de Anne Frank em quadrinhos, que aborda acontecimentos reais que despertam a curiosidade dos jovens. Outro projeto do colégio é o Bookflix, um catálogo que apresenta livros com adaptações cinematográficas, atualizado a cada três meses. Assim, o aluno pode procurar o livro que inspirou o filme e série que acabou de assistir, e vice-versa. “A biblioteca não é uma competição com a tela. As histórias podem se complementar nos diversos formatos”, comenta Aline.
O professor Lino Gonzaga, responsável pelas aulas de Língua Portuguesa nos ciclos do Ensino Fundamental II e Ensino Médio, trabalha para aproximar os alunos da literatura com intervenções que vão além do texto escrito. Em uma atividade recente, ele propôs a criação de podcasts em que os alunos discutem e analisam livros que leram em grupo, como De Repente, Nas Profundezas do Bosque. Já nas séries iniciais, livros como Pluft, o Fantasminha são trazidos para a sala de aula, onde os alunos têm a oportunidade de encenar cenas da obra após assistir ao filme, o que torna a experiência mais envolvente e lúdica.
“Em um ambiente que valoriza o hábito da leitura desde cedo, os alunos crescem como leitores engajados e críticos, preparados para se expressarem por meio das palavras e apreciarem os múltiplos formatos que a literatura oferece”, afirma Gonzaga.
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Na educação infantil, a coordenadora Beatriz Martins conta que o colégio implementa projetos literários que valorizam o contato dos pequenos com os livros. Alunos de dois a seis anos, por exemplo, criam seus próprios livros sobre diferentes temas, como inteligência socioemocional, sustentabilidade entre outros. As atividades culminam em um grande evento, “Book Fair”, com direito a sessões de autógrafos na presença das famílias. “Esse projeto fortalece o vínculo dos pequenos com a leitura, e as crianças aprendem a respeitar e valorizar a literatura”, comenta Beatriz.
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Visita de autores enriquece a leitura
Na Escola Bilíngue Aubrick, de São Paulo, a leitura é parte integrante da rotina escolar desde os primeiros anos. A alfabetização se inicia aos quatro anos, e o contato diário com diferentes gêneros textuais – como poesia, contos de fadas e textos instrucionais – acontece em português e inglês, criando uma experiência bilíngue e inclusiva.
Este semestre, os pequenos alunos do Infantil estão mergulhados no universo do livro de dois títulos: Passarinhos do Brasil - Poemas que Voam, escrito por Lalau e ilustrado por Laura Beatriz; e Toinhonhoim e a Força dos Cabelos Encaracolados, de Ilan Brenman, que aborda a diversidade cultural e a valorização da identidade. Os títulos selecionados são explorados por meio de leitura compartilhada, unindo os alunos e alunas em torno de histórias e discussões coletivas que culminam na visita dos autores: os escritores em pessoa vêm presencialmente à escola conversar e trocar experiências com os estudantes.
Segundo a coordenadora pedagógica Eloísa Monteiro, as visitas de autores são essenciais para o desenvolvimento literário e crítico das crianças. "Receber escritores na sala de aula abre espaço para ricas conversas e para que as crianças aprendam sobre o processo criativo de cada autor, o que ajuda a despertar a curiosidade e o interesse pelo ato de ler e escrever", explica.
A visita dos autores conta com uma sessão de autógrafos e conversa dos autores com os pequenos sobre as inspirações e o processo de criação das obras. As perguntas, preparadas durante as aulas de Língua Portuguesa, refletem o engajamento dos alunos e tornam o momento uma celebração coletiva do aprendizado. “Essa interação faz com que a leitura seja vista como uma atividade viva, onde as crianças não só consomem, mas dialogam com o que leem,” conclui Eloísa.
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Projeto de leitura internacional
Desde 2012, a Escola Internacional de Alphaville, em Barueri, tem fortalecido o hábito da leitura entre seus alunos com o projeto Reading and Writing Project, da Columbia University, de Nova York. O programa, que inicialmente envolveu as turmas do Kids 5 (Educação Infantil) e Juniors (Ensino Fundamental I), agora, em 2024, foi estendido ao Teens (Ensino Fundamental II), expandindo o impacto e a profundidade das práticas de leitura e escrita na escola.
A proposta do Reading and Writing Project, desenvolvido pelo Teachers College da Columbia University, é transformar salas de aula em espaços ativos de leitura e escrita, onde os alunos são incentivados a explorar livros e desenvolver narrativas com uma abordagem crítica e criativa. O projeto é desenhado especialmente para educadores, professores e colaboradores, oferecendo formação continuada sobre as mais inovadoras técnicas de ensino literário. "Queremos que nossos alunos se tornem leitores que refletem sobre o que leem e escritores que saibam se expressar com clareza e autenticidade", afirma Ricardo Chioccarello, diretor da instituição.
O programa também integra uma estrutura robusta de avaliação de desempenho, mapas curriculares e progressões de aprendizagem, que ajudam os professores a monitorar o desenvolvimento dos estudantes e ajustar estratégias para atender melhor às suas necessidades. "Com o Reading and Writing Project, conseguimos adaptar o conteúdo de forma que respeite o ritmo de cada aluno, o que torna a aprendizagem mais significativa", completa Chioccarello.
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