As inúmeras tatuagens no corpo refletem uma vida cheia de histórias e muita fé, já que a maior delas é o desenho de Jesus crucificado que toma quase toda a pele de suas costas. A.L., 47 anos, que prefere ter sua identidade preservada, já foi soldador, caldeireiro e trabalhou para a Marinha Mercante.
Nesta segunda-feira (8), às 6h, com uma pequena mochila de nylon guardando seus pertences e vestindo camiseta, bermuda e chinelos gastos, e com toda a fé que tinha em seu coração, A.L. era o primeiro da fila no Centro Pop, unidade de atendimento à população de rua. À espera da abertura da unidade às 8h, ele foi pleitear uma passagem para Campinas (SP), sua cidade natal, um serviço de recâmbio oferecido pela Prefeitura. “Quero muito voltar, reconstruir a minha vida e realizar os meus sonhos que eu não consegui realizar por aqui”.
Logo que o equipamento abriu, A.L. passou pela equipe técnica que ouviu a sua história. Como tinha em mãos um documento e contato de um familiar na cidade, que são requisitos para o serviço, o pedido foi atendido e a passagem já foi marcada para esta terça-feira (9). “Agora sim, a minha vida vai mudar, com a ajuda de Deus”.
A. L. veio para Santos pela primeira vez aos dois anos de idade para se juntar à sua mãe que trabalhava na região. “Fiquei com a minha avó em Campinas quando nasci e minha mãe voltou para Santos para trabalhar. Meu pai era Uruguaio e trabalhava para a Marinha Mercante, então estava sempre embarcado”.
Na sua adolescência decidiu trabalhar com o pai na Marinha e pouco tempo depois começou a se envolver com drogas. “Tinha um bom salário e era muito jovem e sem responsabilidades, então me aproximei de más companhias e gastava todo o meu dinheiro com saídas noturnas e drogas, foi a partir daí que comecei a me perder na vida”.
“Se você me perguntar hoje o que as drogas representam na minha vida eu não vou saber te responder. É algo poderoso, muito ruim, que dá a sensação de precisar dela sempre. A igreja ou a internação nunca vão ajudar se você mesmo não tiver força de vontade para sair do vício. Só você pode se ajudar e, eu posso afirmar, é muito difícil. Com fé em Deus vou conseguir me libertar em minha nova vida em Campinas”.
Quando questionado sobre o seu maior sonho, A. L., visivelmente emocionado, olha para baixo e reflete um pouco antes de responder. “Quero uma casa que seja minha e quero também dividir minha vida com alguém especial. Nos meus piores momentos, nunca tive ninguém que realmente se preocupasse. Não quero mais me sentir tão sozinho”.
Serviço busca retorno ao convívio familiar
Dentre os diversos serviços ofertados para as pessoas em situação de rua do Município, a Secretaria de Desenvolvimento Social da Prefeitura oferece o retorno ao convívio familiar e comunitário em sua cidade de origem, por meio do recâmbio qualificado, que é realizado pelo Centro Pop. Desde 2017, já foram realizados mais de 1.200 recâmbios para São Paulo capital e outros municípios.
A responsável pelo Centro Pop, Fernanda Bernardini de Araújo, destaca que o programa é um benefício pontual, fornecido uma vez para pessoas que estão em situação de rua e que desejam retornar à cidade de origem, para se unirem aos seus familiares.
“Quando atendemos alguém que vive nas ruas e que demonstra o desejo de voltar para a sua cidade, nós orientamos que para ter acesso a esse benefício é preciso portar pelo menos um documento, ou boletim de ocorrência com um número de documento, e um número de contato de algum familiar, parente ou conhecido para garantir que a pessoa tem vínculo com o município de destino”. O atendimento no Centro Pop, que fica na Rua Amador Bueno, 446 (Paquetá), ocorre de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h.