Rafael Cervone*
O Brasil terminou 2023 com duas conquistas consideráveis, representadas pela prorrogação até 2027 da desoneração da folha de pagamentos e a histórica aprovação da reforma tributária depois de três décadas de frustradas tentativas. A primeira, embora muito positiva, não representa uma redução de encargos, apenas evitando seu agravamento, pois já vinha sendo aplicada desde 2012. Quanto ao novo sistema de impostos, é um avanço estrutural, com impacto significativo na economia.
As boas notícias, porém, não devem desviar o foco, neste início de 2024, dos obstáculos que continuam limitando o crescimento sustentado do País. Em primeiro lugar, devemos ficar atentos à regulamentação, por meio de legislação infraconstitucional, das alíquotas da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de âmbito federal, e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), na esfera de estados e municípios. É determinante que a taxação não exceda à carga atual paga pelos brasileiros, conforme trava constante da PEC 45. Que se cumpra, sem jaboticabas e subterfúgios.
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É preciso considerar, ainda, que a reforma tributária, apesar de seu inegável efeito psicológico e de estímulo ao ambiente de negócios, terá um longo período de transição até 2032. Por isso, é imprescindível equacionar os fatores nocivos à competitividade nacional passíveis de solução em prazo mais curto. Um deles refere-se aos juros, que precisam cair de modo mais acentuado, pois, a despeito da curva descendente no segundo semestre de 2023, ainda estão entre os mais elevados do mundo.
Outra providência importante é a melhoria da segurança jurídica. Exemplo do quanto isso é prioritário verifica-se na esfera da pequena reforma trabalhista de 2017 (Lei 13.467), cujas disposições seguem enfrentando resistências nos tribunais, o que limita seus
efeitos práticos. Os acordos soberanos entre empregadores e recursos humanos não podem permanecer submetidos à subjetividade e interpretações. Leis devem ser cumpridas. Outro aspecto é o encontro de uma solução definitiva para a contribuição previdenciária patronal. É desgastante, como ocorreu em 2023, a incerteza quanto à continuidade da desoneração da folha. Empresas necessitam de previsibilidade.
Iniciativa com reflexos positivos relevantes é o Programa de Depreciação Imediata, destinado à renovação de máquinas e equipamentos do parque fabril. Estamos empenhados no sentido de que sua implementação ocorra o mais brevemente possível. Cabe esclarecer que não representa renúncia fiscal para o erário, mas sim o adiamento das cobranças da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ). Portanto, sem ônus para o Estado, poderemos promover notável modernização da indústria, seu aporte tecnológico já com foco na transição energética, digitalização e descarbonização e criação de empregos.
Acredito que a rápida adoção das medidas aqui abordadas poderá até mesmo levar o Brasil a superar as estimativas para o crescimento do PIB em 2024, em torno de 1,5%. Tal índice é baixo para um país que precisa criar milhões de postos de trabalho, elevar de modo expressivo o nível de investimentos e ampliar sua competitividade, não apenas para ganhar espaço no comércio global, como para defender o próprio mercado interno da concorrência com produtos estrangeiros, cuja produção não tem os mesmos ônus que os nossos. Que a reforma tributária inspire a realização da administrativa, também essencial, e o destravamento de todos os outros fatores que, há tanto tempo, vêm impedindo anos novos mais felizes.
*Rafael Cervone, engenheiro e empresário, é presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP) e primeiro vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).